terça-feira, 23 de novembro de 2010

Amigo é coisa pra se guardar...

Dário e Tércio: dois grandes amigos que sempre representam em tudo. Quanto mais eu os conheço, mais eu vejo como o ser humano pode ser aberto para novas afetações e novos caminhos criativos de uma vivência em união entre todos e a natureza. Não há um solipsismo, nem condições materiais para que a amizade seja sempre verdadeira e ligada ao amor em comum, pelo simples fato haver um querer bem entre os amigos sinceros. A vida torna-se um dia ensolarado em meio à multidão obscurecida que, por não-merecimento e falta de amor, jamais vão saber e entender o que é uma amizade verdadeira.


Parabéns por serem grandes amigos e seres humanos sinceros e maravilhosos como vocês são, Tércio Soares e Dário Luke...

terça-feira, 16 de novembro de 2010

Quando o interesse "desvia" a comunicação



Apresento-lhes o relato histórico de Judy Wallman, pesquisadora estadunidense na área de genealogia:

Durante pesquisa da árvore genealógica de sua família, Judy Wallman deu de cara com uma informação interessante e curiosa. Um tio-bisavô, Remus Reid, era ladrão de cavalos e assaltante de trens. No verso da única foto existente de Remus (em que ele aparece ao pé de uma forca) está escrito:

"Remus Reid, ladrão de cavalos, mandado para a Prisão Territorial de Montana em 1885, escapou em 1887, assaltou o trem Montana Flyer por seis vezes. Foi preso novamente, desta vez pelos agentes da Pinkerton, condenado e enforcado em 1889."

Acontece que o ladrão Remus Reid é ancestral comum de Judy e do Senador pelo Estado de Nevada, Harry Reid. Então Judy enviou um e-mail ao Senador solicitando informações sobre o parente comum. Mas não mencionou que havia descoberto que o sujeito era um bandido. A atenta assessoria do Senador respondeu desta forma:

"Remus Reid foi um famoso vaqueiro no Território de Montana. Seu império de negócios cresceu a ponto de incluir a aquisição de valiosos ativos eqüestres, além de um íntimo relacionamento com a Ferrovia de Montana. A partir de 1883 dedicou vários anos de sua vida a serviço do governo, atividade que interrompeu para reiniciar seu relacionamento com a Ferrovia. Em 1887 foi principal protagonista em uma importante investigação conduzida pela famosa Agência de Detetives Pinkerton. Em 1889, Remus faleceu durante uma importante cerimônia cívica realizada em sua homenagem, quando a plataforma sobre a qual ele estava cedeu."

É curioso analisar como o interesse político é capaz de desviar totalmente uma informação (comunicação). A interpretação do relato feito por Judy Wallman pode ser dissecada da seguinte maneira:

Texto 1 + texto 2 - Sem coesão e coerência: análise somente da intertextualidade e não da forma gramatical...

"Remus Reid, ladrão de cavalos [...] Seu império de negócios cresceu a ponto de incluir a aquisição de valiosos ativos eqüestres [...] mandado para a Prisão Territorial de Montana em 1885, escapou em 1887, assaltou o trem Montana Flyer por seis vezes [...] além de um íntimo relacionamento com a Ferrovia de Montana. A partir de 1883 dedicou vários anos de sua vida a serviço do governo, atividade que interrompeu para reiniciar seu relacionamento com a Ferrovia [...] Foi preso novamente, desta vez pelos agentes da Pinkerton [...] Em 1887 foi principal protagonista em uma importante investigação conduzida pela famosa Agência de Detetives Pinkerton [...] condenado e enforcado em 1889 [...] Remus faleceu durante uma importante cerimônia cívica realizada em sua homenagem, quando a plataforma sobre a qual ele estava cedeu."

O desvio comunicativo feito pela assessoria do Senador Reid manteve alguns pontos em comum com o texto original escrito por detrás da única foto existente de Remus. Por mais que o interesse político estivesse presente na resposta dada a Judy, o conteúdo do informativo manteve as datas, os locais e as instituições mencionadas tal como estava no texto original. Sendo assim, fica aparente a intertextualidade interpretativa entre as duas "verdades" opostas. Quando o fato parece distante, o que nos resta é a interpretação. Talvez seja apenas isto que sobra.

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

É ela...


Quando a vi pela primeira vez, confesso que fiquei com certo receito. Apesar de rodeada de brasileiras, não se misturava, unindo-se somente com as estrangeiras.

Visivelmente diferente das outras, pela sua cor nada comum em nosso país, tornou-se alvo de atenção de todos nós. Particularmente, achei linda, de uma beleza exótica e inconfundível, apesar de saber que no fundo, era apenas uma loira. Muito acanhado, resolvi me aproximar, ver melhor, sabe como é, aquela necessidade que todo homem tem de ficar perto das melhores. Comuniquei-me com ela, analisei bem, barganhei um pouco é verdade, mas sabia que poderia gostar do que estava por vir. Aquele sotaque holandês me encantou de tal forma que só poderia terminar em coisa boa. Cheguei mais perto, segurei firmemente. Percebi que era tão gelada como qualquer outra européia. Encostei a boca na boca dela. Surpreendentemente, a beleza inicial, incomum aos nossos padrões visuais, escondia um amargo imenso. Durante essa experiência, fui remetido ao clima frio, depressivo e questionador dos países baixos. Porém, dessa amargura vasta, adveio um prazer infinito, que se transforma em alegria e realidade, numa clareza de idéias sem tamanho.

Atualmente não consigo viver sem ela. Busco-a sempre que possível, seja onde for, eu vou ao seu encontro. O que a torna tão especial, no final das contas, não é suas proporções distintas ou sua origem indefectível; é o extrato de todas suas características, de suas qualidades. Por tudo que nos oferece, assim me rendo a ti, elixir da verdade, HEINEKEN querida!

sábado, 13 de novembro de 2010

Triunfo

Música instrumental, ambiente e "viajante" da banda Wanted



Bons sonhos...

Os dois caminhos

Qual dos dois caminhos vós escolheis?

sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Velharia


VIII
Elisão


Seguindo os meus próprios passos
Sinto a dor e vacilo ao perceber
Que tantas vidas podem padecer,
De tanto medo em unir-se em laços.

Tristeza acumulativa,
Fraqueza continuamente enfadonha;
Vejo almas perdidas, vidas transpostas à ilusão humana.
Pobreza real,
Riqueza enganosa;
Beijos caçados em prol de ficções -
Não ser aliado à convicção mundana.

Ter valor é ser escolhido à não tê-lo;
Vais manter contido o brio que torna
Mais fraca a dor que te mostra zelo...
Condenado ao círculo que te suborna.

Gênio escondido;
Falta de compreensão cativada.
Sem sentido ao senti-lo em palavras frouxas!
Unção comum, irreal e profanada;
Parecer retraído.

Paga-se uma conta real;
Volta-me à tona a verdade
Nos avanços em que contenho,
Para jamais utilizar a irrealidade.

Tudo aquilo que fôra demonstrado ser puro,
Não passou de um ato falho, sem valor.
Não me comove mais as reações de orgulho,
E nem me dói demais um querer sem amor:
Sem calor
Nem clamor.
Só um destino é valido
Para quem se sente inválido.

Continuo na estrada sem condução.
Apenas observo os trejeitos desastrosos,
E os ideais que são um senso em união,
Reunidos a vacilar perante os seres honrosos.

As raízes são mais fortes que os aprendizados olvidados.
A brutalidade torna-se orgulho diante da massa mais asnática;
Fico entristecido ao verificar que os valores foram trocados.
A naturalidade humana traz a comunhão entre seres enigmáticos;
Pelo fato servil, pela crença fastidiosa, original e histórica.

Conto estórias aos que me dão atenção,
Dôo carinho aos que me fazem viver.
Termino algumas breves relações inexatas
Que meu coração insiste em acolher;
Mas minha razão busca afastar qualquer emoção.

Nesse quarto, encontro-me.
Nesse mundo sou celibatário, perco-me.
Vejo a doença incrustada em meu ser;
Já termino a prosa! Não quero mais...

Quaderno (parte2 - Flo Menezes/Daniel Murray)

Sei que poucas pessoas vão ver, ouvir e comentar...

O retrato oval

Edgar Allan Poe


O castelo em que meu criado se aventurara a forçar entrada, em lugar de deixar-me passar uma noite ao relento, gravemente ferido como eu estava, era um daqueles edifícios mesclados de soturnidade e grandeza que por muito tempo carranquearam entre os Apeninos, tanto na realidade quanto na imaginação da Sra. Radcliffe. Ao que tudo indicava, fora abandonado havia pouco e temporariamente. Acomodamo-nos num dos quartos menores e menos suntuosamente mobiliados, que ficava num remoto torreão do edifício. Sua decoração era rica, porém esfarrapada e antiga. As paredes estavam forradas com tapeçarias e ornadas com diversos e multiformes troféus heráldicos, juntamente com um número inusual de espirituosas pinturas modernas em molduras de ricos arabescos dourados. Por essas pinturas, que pendiam das paredes não só de suas principais superfícies, mas de muitos recessos que a arquitetura bizarra do castelo fez necessários, por essas pinturas meu delírio incipiente, talvez, fizera-me tomar interesse profundo; de modo que ordenei a Pedro fechar os pesados postigos do quarto – visto que já era noite –, acender um alto candelabro que se encontrava
à cabeceira de minha cama e abrir amplamente as cortinas franjadas de veludo negro que a envolviam. Desejei que tudo isso fosse feito para que pudesse abandonar-me, ao menos alternativamente, se não adormecesse, à contemplação das pinturas e à leitura atenta de um pequeno volume encontrado sobre o travesseiro que se propunha a criticá-las e descrevê-las.

Por longo, longo tempo li, e com devoção e dedicação contemplei-as. Rápidas e gloriosas, as horas voavam e a meia-noite profunda veio. A posição do candelabro desagradava-me, e estendendo a mão com dificuldade, em vez de perturbar meu criado adormecido, ajeitei-o a fim de lançar seus raios de luz mais em cheio sobre o livro.

Mas a ação produziu um efeito completamente imprevisto. Os raios das numerosas velas (pois eram muitas) agora caíam num nicho do quarto que até o momento estivera mergulhado em profunda sombra por uma das colunas da cama. Assim, vi sob a luz vívida um quadro não notado antes. Era o retrato de uma jovem, quase mulher feita. Olhei a pintura apressadamente e fechei os olhos. Não foi a princípio claro para minha própria percepção por que fiz isso. Todavia, enquanto minhas pálpebras permaneciam dessa forma fechadas, revi na mente a reação de fechá-las. Foi um movimento impulsivo para ganhar tempo para pensar – para certificar-me de que minha vista não me enganara –, para acalmar e dominar minha fantasia para uma observação mais calma e segura. Em poucos momentos, novamente olhei fixamente a pintura.

O que agora via, certamente não podia e não queria duvidar, pois o primeiro clarão das velas sobre a tela dissipara o estupor de sonho que me roubava os sentidos, despertando-me imediatamente à realidade.

O retrato, já o disse, era o de uma jovem. Uma mera cabeça e ombros, feitos à maneira denominada tecnicamente de vinheta, muito ao estilo das cabeças favoritas de Sully. Os braços, o busto e as pontas dos radiantes cabelos dissolviam-se imperceptivelmente na vaga mas profunda sombra que formava o fundo do conjunto. A moldura era oval, ricamente dourada e filigranada à mourisca. Como objeto artístico, nada poderia ser mais admirável do que aquela pintura em si. Mas não seria a elaboração da obra nem a beleza imortal daquela face o que tão repentinamente e com veemência comovera-me. Tampouco teria minha fantasia, sacudida de seu meio-sono, tomado a cabeça pela de uma pessoa viva. Vi logo que as peculiaridades do desenho, do vinhetado e da moldura devem ter dissipado instantaneamente tal idéia – e até mesmo evitado sua cogitação momentânea. Pensando seriamente acerca desses pontos, permaneci, talvez uma hora, meio sentado, meio reclinado, com minha vista pregada ao retrato. Enfim, satisfeito com o verdadeiro segredo de seu efeito, caí de costas na cama. Descobrira o feitiço do quadro numa absoluta naturalidade de expressão, a qual primeiro espantou-me e por fim confundiu-me, dominou-me e aterrorizou-me. Com profundo e reverente temor, recoloquei o candelabro em sua posição anterior. Sendo a causa de minha profunda agitação colocada assim fora de vista, busquei avidamente o volume que tratava das pinturas e suas histórias. Dirigindo-me ao número que designava o retrato oval, li as vagas e singulares palavras que se seguem:

“Era uma donzela de raríssima beleza, não mais encantadora do que cheia de alegria. Má foi a hora em que viu, amou e desposou o pintor. Ele, apaixonado, estudioso, austero, e tendo já na sua Arte uma esposa; ela, uma donzela de raríssima beleza, não mais encantadora do que cheia de alegria; toda luz e sorrisos, e travessa como uma corça nova; amando e acarinhando todas as coisas; odiando apenas a Arte, sua rival; temendo só a paleta, os pincéis e outros desfavoráveis instrumentos que a privavam do rosto de seu amado. Era, portanto, uma coisa terrível para essa dama ouvir o pintor falar de seu desejo de retratar justo sua jovem esposa. No entanto, ela era humilde e obediente, e posou submissa por muitas semanas na escura e alta câmara do torreão, onde a luz caía somente do teto sobre a pálida tela. Mas ele, o pintor, glorificava-se com sua obra, que continuava de hora a hora, dia a dia. E era um homem apaixonado, impetuoso e taciturno, que se perdia em devaneios; de maneira que não queria ver que a luz espectral que caía naquele torreão isolado debilitava a saúde e a vivacidade de sua esposa, que definhava visivelmente para todos, exceto para ele. Contudo, ela continuava a sorrir imóvel, docilmente, porque viu que o pintor (que tinha grande renome) adquiriu um fervoroso e ardente prazer em sua tarefa, e trabalhava dia e noite para pintar a que tanto o amava, aquela que a cada dia ficava mais desalentada e fraca. E, em verdade, alguns que viam o retrato falavam, em voz baixa, de sua semelhança como de uma poderosa maravilha, e uma prova não só da força do pintor como de seu profundo amor pela qual ele pintava tão insuperavelmente bem. Finalmente, como o trabalho aproximava-se de sua conclusão, ninguém mais foi admitido no torreão, pois o pintor enlouquecera com o ardor de sua obra, raramente desviando os olhos da tela, mesmo para olhar o rosto de sua esposa. Não queria ver que as tintas que espalhava na tela eram tiradas das faces da que posava junto a ele. E quando muitas semanas nocivas passaram e pouco restava a fazer, salvo uma pincelada na boca e um tom nos olhos, o espírito da dama novamente bruxuleou como a chama de uma lanterna. Então, a pincelada foi dada e o tom aplicado, e, por um momento, o pintor deteve-se extasiado diante da obra em que trabalhara. Porém, em seguida, enquanto ainda contemplava-a, ficou trêmulo, muito pálido e espantado, exclamando em voz alta: ‘Isto é de fato a própria Vida!’
Voltou-se repentinamente para olhar sua amada: estava morta!”

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

A foto é velha...


... mas a amizade sempre se renova!

Este é o meu primo, Vini. Ele também escreve eventualmente aqui no blog; está em todas, sempre dando um grande apoio para os amigos.

Abraços,

E.B.

Obs.: a foto foi tirada no casamento do meu irmão mais velho, já faz alguns bons anos.

terça-feira, 9 de novembro de 2010

Mais um grande amigo



Agora sou eu e o Felipe (Few, Lipe, Feel, Fell, Felp etc.), rs...

Mais uma foto com mais um grande amigo. Além de ser uma pessoa fantástica, o Few é um excelente guitarrista e compositor.
É uma honra tocar contigo na Wanted, meu caro.

Por falar em Wanted: www.myspace.com/bandawanted

Abraços,

E.B.

Amizade




Eduardo Bento e Thiago Soares...

Não vou postar textos grandiosos ou frases de efeito. A amizade não precisa de argumentos e evidências para ser alguma coisa admirável e silenciosa (para a multidão).

Não me venham dizer que sou muito hermético...

Abraços,

E.B.

domingo, 7 de novembro de 2010

Quaderno (parte1 - Flo Menezes/Daniel Murray)

Assistam o vídeo abaixo:



Acharam a música "monstruosa" demais? Deixem seus comentários a respeito...

sábado, 6 de novembro de 2010

Filme: O Enigma de Kaspar Hauser


Alemanha Ocidental 1974 - cor - 110 min
Título original: Jeder für sich und Gott gegen alle
Direção: Werner Herzog

Roteiro: Werner Herzog e Jakob Wassermann
Elenco: Bruno S., Walter Ladengast, Brigitte Mira, Willy Semmelrogge

Género: drama

Idioma original: alemão


Certa vez, este filme foi recomendado por uma professora minha da faculdade porém, eu já tinha assistido esta produção bem antes de começar o curso de filosofia. Aqui em casa, há muito tempo, já tínhamos o VHS deste drama tão marcante.
Eu nunca havia feito uma "leitura" fenomenológica acerca do Egnima de Kaspar Hauser antes de começar a cursar filosofia - se é que agora eu fiz algum tipo de leitura -, destarte, talvez com um olhar diferenciado sobre como pode ser a vida sem experiências, as cenas me levaram para uma compreensão (no sentido de abarcar) menos inautêntica do que outrora tinha me levado para um mero drama silencioso de uma cotidianidade atrelada à publicidade que se tornou a vida contemporânea que, historicamente, sempre aceita questões lógicas ou científicas como a verdade do que o ser exatamente é.

Os acasos anteriores não me levaram ao conceito, ou melhor, à vivência empírica que tirariam os meus dias da total claridade circular, para uma inédita escuridão misteriosa que transferiria minha exatidão privada para um estado de completa atitude de abertura a tudo que, em termos gregos, constitui-se em um πάθος daquilo que antes tinha uma significação evidente para mim e que, nesse momento, transformou um dia claro em tempestade e escuridão de uma noite monstruosa e angustiante.
Este é o sentimento que o filme e todas as outras condições artísticas têm me dado de presente, como se eu fosse um mero ente movido por afetações que nunca fecham um ciclo, ou que estão distantes do contexto atualmente aceito. Poucas palavras, dentro de tal linguagem, jamais poderiam dizer qual é esta condição possível do novo contexto em que me sinto cada vez mais inserido.

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

Uma parábola...


"Num lugar não muito longe daqui havia um poço fundo e escuro onde, desde tempos imemoriais, uma sociedade de rãs se estabelecera. Tão fundo era o poço que nenhuma delas jamais havia visitado o mundo de fora. Estavam convencidas de que o universo era do tamanho do seu buraco. Havia sobejas evidências científicas para corroborar essa teoria, e somente um louco, privado dos sentidos e da razão, afirmaria o contrário. Aconteceu, entretanto, que um pintassilgo que voava por ali viu o poço, ficou curioso e resolveu investigar suas profundezas. Qual não foi sua surpresa ao descobrir as rãs! Mais perplexas ficaram elas, pois aquela estranha criatura de penas colocava em questão todas as verdades já secularmente sedimentadas e comprovadas em sua sociedade. O pintassilgo morreu de dó. Como é que as rãs podiam viver presas em tal poço, sem ao menos a esperança de poder sair? Claro que a ideia de sair era absurda para os batráquios pois, se o seu buraco era o universo, não poderia haver um ‘lá fora’. E o pintassilgo se pôs a cantar furiosamente. Trinou a brisa suave, os campos verdes, as árvores copadas, os riachos cristalinos, borboletas, flores, nuvens, estrelas... o que pôs em polvorosa a sociedade de rãs, que se dividiram. Algumas acreditaram e começaram a imaginar como seria lá fora. Ficaram mais alegres e até mesmo mais bonitas. Coaxaram canções novas. As outras fecharam a cara. Afirmações não confirmadas pela experiência não deveriam ser merecedoras de crédito, elas alegavam. O pintassilgo tinha de estar dizendo coisas sem sentido e mentiras. E se puseram a fazer a crítica filosófica, sociológica e psicológica do seu discurso. A serviço de quem estaria ele? Das classes dominantes? Das classes dominadas? Seu canto seria uma espécie de narcótico? O passarinho seria um louco? Um enganador? Quem sabe ele não passaria de uma alucinação coletiva? Dúvidas não havia de que tal canto tinha criado muitos problemas. Tanto as rãs-dominantes como as rãs-dominadas (que secretamente preparavam uma revolução) não gostaram das ideias que o canto do pintassilgo estava colocando na cabeça do povão. Por ocasião de sua próxima visita o pintassilgo foi preso, acusado de enganador do povo, morto, empalhado e as demais rãs proibidas, para sempre, de coaxar as canções que ele lhes ensinara...” (ALVES, R. O que é religião? p. 117-118).

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Sem significado

"Um poema deveria ser palpável e mudo
como um fruto redondo,
um poema deveria não ter palavras
como o voo dos pássaros,
um poema não deveria significar coisa alguma
e simplesmente... ser".

- Archibald MacLeish.

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Um texto (não é grande coisa)


Ser e tempo: apresentação dos conceitos da existência autêntica em oposição à vida inautêntica.

EDUARDO DE ARAÚJO BENTO

Os conceitos que serão aqui apresentados, dão vazão a uma possibilidade de compreensão de apenas parte da teoria heideggeriana acerca da autenticidade, proposta por uma abertura completa do ser do Dasein. Contudo, aqui também será analisado como o ente encara sua cotidianidade mediana (e “pública”), com indícios ao caráter existenciário de uma vida inautêntica; o ser do ente não é “experimentado” abundantemente e abarcado conscientemente, assim como na compreensão do ser e do tempo em suas condições gerais das possibilidades de existência.

O tempo, em seu aspecto ontológico, é um movimento extático, ou seja, é a compreensão da abertura total do ser enquanto ente em êxtase. O Dasein é lançado à uma retomada ao advir, com aquilo que passou, gerando o apresentar-se no instante da decisão – não há uma consideração subjetiva e objetiva em três tempos diversos: na cotidianidade há uma preferência pela queda (decadência) no presente. Na concepção heideggeriana o futuro é primaz, sendo o passado ainda presente e, ao apresentar-se no “presente” como poder-ser; vai da abertura ao cuidado a partir das possibilidades existenciais. Portanto, é digno da compreensão geral no tempo com o Dasein, e é essencial explicitar as maneiras (modos) do tempo nas duas estruturas admitidas, ou seja, a vulgar e a “admirável”: na concepção vulgar o presente é o eixo, as vivências passadas são abandonadas e os momentos pósteros são deixados para depois, ainda realizáveis, interminavelmente; no tempo originário o futuro tem prioridade, o passado é a retomada dos momentos vivenciados, e o presente é o momento da tomada de decisão – assim a temporalidade denota a abrangência do ser com um “ir-ter” no tempo, o que dá sentido ao Dasein como condição existencial ao advir.

Outra parte importante da analítica existencial é a dualidade entre sujeito e objeto opondo-se ao Dasein, e dele junto ao mundo. Aqui a cotidianidade comum dá ao ente sua experimentação ôntica, do mesmo modo que não se serve da compreensão ontológica de si. Na realidade, não poderia ser admitido que o conhecimento, nesses termos da cotidianidade comum, se faz da relação entre sujeito e objeto; o que é, e deve ser, coroado como autêntico no Dasein é a abertura da subjetividade do ser deste ente, não como algo dentro do mundo, mas externo de si e com-o-mundo. O Dasein faz-se lugar no mundo que somos, em uma constância distinguível da ideia de sujeito “inserido” no mundo e do objeto subserviente ao mesmo sujeito; na aceitação ôntica-existenciária não há uma relação de possibilidade na abertura externa da subjetividade do Dasein.

Por fim, abordemos os aspectos da angústia existencial, dando vias de acesso ao termo dos conceitos supracitados, ou seja, aqui se aterá toda a estrutura da analítica na existência, com a condição mais autêntica do Dasein enquanto ente de possibilidades; fundamentar-se-á, assim, como já foi citada, a estrutura existencial e autêntica do cuidado (cura). É importante deixarmos claro que, primeiramente, a metodologia heideggeriana acerca da angústia analisa o ôntico do ente e a acepção ontológica do ser: o ôntico se dá na decadência do mundo circundante (intramundo), enquanto o ontológico faz-se “presente” na abertura extrema ao cuidado. E em segundo lugar, a angústia é o sentimento de total abertura do Dasein – diferente de qualquer tristeza fechada em nível ôntico -; ele sente-se abandonado, sem lugar, “dentro” de um vazio e exposto às possibilidades.

A angústia afasta a alienação do mundo circundante pelo seu caráter de estranheza, de sentir-se sem lar. Ela afasta as rotinas, os sensos vulgares de tempo, o conhecimento pela relação sujeito-objeto e as tristezas ônticas do ente. O que é estranho vem sempre marcado por compreender que a cotidianidade, nas relações intramundanas, é fechada às possibilidades do Dasein: a angústia só é “lúcida” quando vem de lugar nenhum, do nada; lucidez que transcende o mundo circundante, que mostra o ser como ele é, ou deva ser, ou possa ser, melhor ainda, passa a ser. Sem lugar e de lugar nenhum, a angústia é angustiada quando vivífica, a partir da analítica, o lugar donde a fenda para as vivências existenciais ficam em total dessemelhança com a decadência na infinitude circundante. Somos finitos e, por isso, a angústia se apresenta e nos autentica.

***

Referências bibliográficas:

HEIDEGGER, M. Ser e tempo – Parte I. Vozes. Petrópolis, 1988.

NUNES, B. Heidegger – Ser e tempo. Acesso em 22/09/2010. Link: http://www.scribd.com/doc/35610771/HEIDEGGER-Martin-Ser-e-Tempo-Parte-I