“Escrevo essa carta em português, desnecessariamente, porque gosto de lembrar o passado de meu avô e minha mãe. Falam que se trata de uma língua morta, pouco usada agora. Era a língua oficial do Estado onde eles nasceram.
Ainda são 16h53min e já acabou a minha cota do dia: 1.200 ml. Faz seis anos que o governo controla o que cada um pode beber por dia. Como sou jovem, só tenho direito a 1.200 ml. Em dois anos subirá para 1.400 ml. Quanto ao banho, utilizamos a água “tratada” em nossa própria residência, nos escassos cinco minutos semanais. Os sanitários são todos químicos, sendo desintegrados todos os dejetos. Os alimentos já vêm pronto, produzidos de forma que consuma menos água. Dizem que agora só restam 2% da água potável existente em 2000. Talvez fosse esse o interesse dos ataques dos anos 30. O país, que pertence a um Estado ao norte da antiga América, foi alvo de um grande golpe em 33. Agora temos todos a mesma nacionalidade, assim como os nascidos na Argentina, Paraguai, Uruguai e demais países da ex-América do Sul.
A água atualmente vale muito. Para ter uma idéia, eu tenho que trabalhar 12 horas por dia para conseguir me alimentar com a ração diária. Produzo dois rifles e meio a cada turno, assim como meus pais. Dizem os mais velhos, como meu avô nascido em 85, que se desperdiçava muita água no inicio do século. O banho durava meia hora, os carros eram lavados semanalmente e as calçadas diariamente. Não se fechava a torneira para escovar os dentes, o que fazemos atualmente a seco. Podia ver muitas variedades de árvores, plantas e animais. A energia não era totalmente feita em usinas nucleares, como agora é. Já não posso sair da minha residência e se expor ao sol, pois o protetor solar fator 400 é muito caro, apesar de proteger a minha pele, causa câncer no fígado e rins. Apesar de haver a produção de órgãos humanos no laboratório (que não faço idéia como é), não teria dinheiro para reposição e já sei que não viverei muitos anos com a iminência de doenças renais e transtornos cerebrais pela desidratação.
Ainda que haja tantas condições adversas, eu me orgulho de comunicar com meus amigos da capital, Washington, usando apenas o pensamento. Pratico esportes apenas contra o computador, não posso suar. Gostaria muito de ter um irmão ou irmã, mas sei que há leis que não permitem isso. Aproveitarei os avanços tecnológicos nos anos que ainda me restam, que impreterivelmente não passarão de duas ou três décadas. Sou James Souza Smith, tenho dezesseis anos, estadosunidense.
São Paulo, 30 de março de 2056.”
Me fez lembrar um pouco o filme "Waterworld" de 1995. Rs.
ResponderExcluirMuito bom texto cara, está de parabéns!
Visões apocalípticas do futuro, talvez seja assim, melhor, ou pior.
Abraço.
Muito bom texto, concordo em grau e gênero. Daqui alguns anos a água valerá ouro e os povos farão guerras por causa dela.
ResponderExcluirMuito bom!!!
ResponderExcluirMas talvez teu nome seja, quem sabe, Ho Souza Tzin... ou Mohandas Souza Pranjab... ou, em um paroxismo delirante, João Souza da Silva...
Abs,
M.